21/12/2010

25º dia – 30/01/2010 – Sábado

- General Guemes – AR a Uruguaiana – BR
- 1.156 km percorridos
- Aproximadamente 14h de viagem
- Consumo: 13,56km/l
- 8 abastecimentos: (Joaquim Gonzales – AR; Monte Quemado – AR; Pampa de Los Guanacos – AR; Sáenz Peña – AR; Resistencia – AR; Saladas – AR; Mercedes – AR; Paso de Los Libres – AR)
- Hotel: River Hotel

O Chaco e a volta ao nosso Brasil
Madrugamos e até poderíamos ter saído mais cedo, mas o senhor da recepção do hotel nos disse que em instantes serviriam o café. Resolvemos aguardar e se arrependimento matasse não estaríamos mais aqui, pois foi o pior café de toda a viagem. Resumia-se a um pão duro e seco sem uma geléia ou manteiga e o leite estava com os granulados do café sem terem se dissolvido. Um horror! Como eles tinham coragem de chamar aquilo de café da manhã? De qualquer forma, valeu a boa vontade e solicitude do senhor, funcionário do hotel. Acima de tudo se preocupou em não nos deixar sem “café da manhã”. Valeu a intenção. Como não deu mesmo para engoli-lo, resolvemos ir embora. A lua cheia brilhava alta no céu, quando chegamos à rua. A estrada que enfrentaríamos hoje ainda não era nossa conhecida. Havia uma grande expectativa em função de relatos que havíamos lido onde o maior inimigo seria o calor da região. Pegamos a estrada, no início um bom trecho de autopista em ótimo estado de conservação e sinalizada, o que nos ajudou muito, pois com a escuridão que estava o reflexo dos “olhos de gato” iluminados pelo farol da moto, foram essenciais para viajarmos com segurança. Depois de um tempo rodando tranquilamente a lua começou a se deitar atrás de nós e a nossa frente percebia-se os primeiros raios de sol. Um belo amanhecer. Entramos a esquerda para agora percorrer a ruta 16, uma pista simples e que corta o Chaco até Resistencia. É uma região “sem atrativos” e muitos bichos soltos na estrada. Atenção constante. Em alguns pontos há plantações em outros somente o matagal quase cobrindo a ruta, ou seja, sem acostamento. Na localidade de Joaquim Gonzales fizemos nossa primeira parada para abastecimento e aproveitamos a “estacion de serviço” com uma boa estrutura para tomarmos um café da manhã delicioso. Incrível que num posto de combustível nós conseguimos tomar um café da manhã decente e num hotel não tivemos esta oportunidade. A cidade é pequena e possui alguma infra-estrutura, vi uma ou duas placas de hotéis, mas não sei como são. De volta a estrada começou a disputa por espaço na pista, pois foram mais de cento e cinqüenta quilômetros com muita borboleta. Nunca tínhamos visto nada parecido. Não era em determinados pontos, mas literalmente por todo o percurso com algumas concentrações mais intensas e outras nem tanto. Eram pontos escuros sobre o asfalto e quando nos aproximávamos elas levantavam vôo e literalmente várias se espatifavam no encontro com o nosso corpo e a moto. Em determinado momento tivemos que parar para limpar a viseira do capacete do Álvaro que não enxergava mais através dela. Na localidade de Monte Quemado paramos para abastecer e novamente lavar as viseiras dos capacetes. O calor começava a aumentar e a cada parada para abastecer necessitávamos comprar água e reabastecer o camelbak para nos mantermos hidratados. A localidade parecia muito pobre, as ruas eram de terra e não parecia ter muita infra-estrutura apesar de já ter lido em relatos de viagem que pessoas ficaram aqui hospedadas. Na estrada havia pouco movimento e os carros que encontramos aparentavam estarem saindo de férias já que era virada de mês e muitos carregavam uma mudança. Como havia pouco movimento e o asfalto estava em bom estado de conservação andávamos sempre acima dos 100 km/h até que levamos um belo susto. Havia um capinzal fechado na beira da estrada com mais de meio metro de altura e dali saiu correndo para atravessar a pista um enorme porco. Tivemos que frear com tudo, a moto dançou muito e quase fomos ao chão. Se o porco não tivesse o rabo enroladinho teríamos levado junto para uma feijoada. Brincadeiras a parte, pois foi por muito pouco realmente que não nos acidentamos batendo na traseira do porco. Dali para frente nós observávamos se existia algum sinal de vida próximo a estrada e diminuíamos a velocidade. Encontramos vários animais soltos na beira da estrada como galinhas, vacas, cavalos, mas nenhum deles se atravessou na pista. Parada em Pampa de Los Guanacos para abastecermos a moto e o camelbak. Encontramos ali no posto um senhor com uma vestimenta bastante interessante e que nos chamou a atenção. Era um Menonita, religião cristã que teve origem no norte da Alemanha. Eles tem uma cultura própria, pois todos os homens usam um macacão jardineira azul marinho, camisa xadrez e um chapéu típico. Andam numa charrete puxada por cavalo. Trabalham na agricultura e com a produção leiteira e de queijos. E que mais chama a nossa atenção é que eles só podem se casar com pessoas da mesma religião. Tivemos contato com menonitas em Bagé onde moramos durante um tempo. É uma cultura diferente da nossa e eles tentam ao máximo preservar a que eles trouxeram da Alemanha onde todos os domingos pela manhã eles vão aos cultos em alemão e as crianças frequentam a escolinha dominical neste período. Porém nesta comunidade em Bagé eles já não usavam mais estas vestimentas típicas e haviam aderido aos nossos costumes. De volta a estrada e depois de alguns quilômetros rodados encontramos um posto policial. Cutuquei o piloto e comentei: - será que vamos deixar alguns pesos por aqui? Um dos policiais estava sobre a pista, pois havia um caminhão com pane mecânica bem em frente ao posto e conversava com o caminhoneiro. O outro estava sentado na sombra de uma frondoza árvore. Paramos atrás do caminhão e ele veio ao nosso encontro e perguntou se eramos brasileiros e nos mandou seguir. Não pediu sequer para ver os documentos. Felizes da vida seguimos viagem. Próximo a Roque Sáenz Peña o movimento aumentou bastante e o ritmo da viagem ficou mais trancado. Paramos para abastecer num posto na beira da estrada e reaplicar o protetor solar, pois sem ele não havia como viajar. É uma cidade mediana com mais de setenta mil habitantes, mas não entramos para conhecer. Até Resistência a viagem continuou com muito movimento e alguns caminhões. Havia nos trevos de acesso as pequenas cidades ou vilarejos uma espécie de rótula o que reduzia o ritmo da viagem. O asfalto melhorou bastante e seguimos tranquilamente. Resistencia é a capital do Chaco e possui mais de trezentos mil habitantes. Por sorte a ruta passa ao largo da cidade, mas parece bem cuidada. Resistencia e sua cidade vizinha Corrientes são separadas pelo rio Paraná, mas a ponte General Manuel Belgrano as une formando um gonglomerado urbano com mais de seiscentos mil habitantes. Abastecemos quase na divisa das duas cidades num posto YPF muito bem estruturado. Tomamos uma senhora vitamina de frutas num ambiente com ar condicionado e com o calor que fazia na rua não dava vontade de sair lá de dentro. Aproveitamos e compramos três mapas de regiões específicas da Argentina que no Brasil são difíceis de encontrar. Atravessamos a ponte e definitivamente deixávamos o Chaco para trás. Tivemos que passar por dentro da cidade de Corrientes para chegarmos a ruta 12 sentido sul e por sorte era sábado e a cidade estava quase deserta, mas mesmo assim enfrentamos várias sinaleiras. Uma cidade muito bem sinalizada o que tornou fácil a nossa passagem por ela. Na periferia da cidade ainda pegamos um pouco de movimento, mas em seguida a estrada estava praticamente vazia. Conseguíamos tocar bem, pois o Álvaro havia criado um desafio para nós e tentávamos atingi-lo. Ele queria completar mil quilômetros em menos de doze horas de viagem. A estrada era uma reta com poucas curvas e praticamente toda plana. Havia poucos vilarejos em torno. Na localidade de Saladas teríamos que abastecer, pois como estávamos acelerando forte e o consumo da moto estava acima da média não teríamos combustível até Mercedes. O piloto queria tocar sem parar para o abastecimento, pois havia bastante movimento no posto e não queria perder tempo. Eu disse a ele que teríamos que abastecer, pois eu não queria ficar no meio do caminho por falta de combustível só para poder completar os mil quilômetros no prazo de doze horas. Fomos abastecer com muitas reclamações de que a fila não andava até que conseguimos ser atendidos. De volta a estrada fizemos alguns cálculos e seria possível vencer o desafio se continuássemos neste ritmo. Mais a frente havia uma viatura da polícia passeando pela estrada e justamente num local onde era proibida a ultrapassagem. Foram alguns minutos a quarenta por hora atrás daquela viatura que pareceram uma eternidade. Finalmente ultrapassamos, mas em seguida passamos por um pequeno vilarejo e havia uma camionete andando no meio da pista. Não permitia a ultrapassagem e andava muito devagar. Depois descobrimos o motivo: um bezerro solto passeando sobre a pista bem em frente ao carro e não conseguíamos ver o bicho. Finalmente ele decide voltar ao capinzal que há ao lado da estrada e voltamos a acelerar. Teríamos que pegar a esquerda e seguir a ruta 123, mas como na Argentina as placas de sinalização são colocadas após a rotatória percebemos após alguns metros que estávamos no caminho errado e tivemos que voltar. Agora sim estávamos no caminho certo e aceleramos. Faltando alguns quilômetros para a cidade de Mercedes fechávamos os mil quilômetros com onze horas e cinquenta e quatro minutos de viagem. Uma parada para fotografar o momento em meio aos campos argentinos e uma esticada nas pernas. O cansaço já era grande, pois viajávamos o dia todo com sol e muito calor. A bunda começava a doer. De volta a estrada em instantes passávamos por um local onde havia muita homenagem a Gauchito Gil e achamos que era um vilarejo que levava o seu nome. No trevo de acesso a Mercedes estavam restaurando o asfalto e tivemos que entrar na cidade cerca de cinco quilômetros para abastecer. Conversando com o frentista descobrimos que o local onde havia toda aquela homenagem a Gauchito Gil era o local onde ele fora morto. E hoje virou um santuário, fica a uns oito quilômetros de Mercedes, e seu túmulo é visitado por milhares de pessoas todos os anos. Gauchito virou figura religiosa, objeto de devoção e crenças populares. Na Argentina se encontra muitas homenagens a ele na beira das estradas sempre sinalizadas com bandeiras e fitas vermelhas. Pouco mais de cem quilômetros e estaríamos na fronteira com o Brasil. É engraçado, pois fiquei com aquele ansiedade de chegar e parecia que não saímos do lugar. Passamos por um posto policial onde paramos, pois o militar estava parado sobre a pista, ele nos pergunta se somos brasileiros indo para casa e nos libera desejando boa viagem. Continuamos acelerando, pois a saudade de casa era grande. Na ruta 14 pegamos a direita e em seguida já reconhecíamos as obras da construção do viaduto que estava causando uma tremenda confusão no entorno. Aqui fechávamos o círculo desta viagem, pois foi por onde saímos em direção ao sul e agora voltávamos pelo norte. Fomos dar uma volta na cidade de Paso de Los Libres, pois o Álvaro interpretou mal uma placa de sinalização. O que não faz a emoção de estarmos perto de casa. Na fronteira o Álvaro vai para a fila do YPF abastecer com a ótima gasolina argentina e gastar nossos últimos pesos enquanto vou providenciar os carimbos de saída nos nossos passaportes. Os trâmites de saída foram tão rápidos que o Álvaro ainda estava na fila esperando ser atendido quando retornei ao posto. Enquanto esperava na fila veio um rapaz oferecer um hotel para nos hospedarmos em Uruguaiana que ficava logo na saída da ponte. Passamos pela aduana, atravessamos a ponte e rodávamos em terras brasileiras. Que sensação maravilhosa! Fomos ao hotel ver se havia vaga, porém o preço que nos passaram estava mais caro que o preço que o rapaz havia nos oferecido. Comento sobre a oferta do rapaz na fronteira e ele pede para ver o folder do hotel com o preço. Tudo certo. Moto na garagem e subimos ao quarto, pois o que mais queríamos era tirar aquelas roupas suadas e tomar um banho. Ainda brincamos: como eles tem coragem de hospedar pessoas como nós, pois estávamos com as roupas e botas totalmente cobertas pelos restos de borboleta, suados e fedorentos. Banho tomado e vamos ao centro para jantar. Comemos um delicioso rodízio de filés e após fomos dar uma volta na praça para fazer a digestão. De volta ao hotel caímos duros na cama para o merecido descanso depois de mil e poucos quilômetros percorridos. E amanhã sim: de volta a nossa casa.













Um comentário:

  1. Alvaro e Adelaide!
    Que bom ler este relato da chegada no Brasil. Já estava aguardando... mas pensando que estes momentos de agora estão voltados para a chegada do Artur.
    Estamos com saudades e todos os dias dou uma espiadinha no blog.
    Um abração e um Feliz Natal.
    Manja,Serra e Lili

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