22/08/2010

20º dia (Parte III) – 25/01/2010 – Segunda-feira

Cuzco – PE a Puno – PE
- 390,7km percorridos
- aproximadamente 11h de viagem
- consumo: 16,14km/l
- 2 abastecimentos: (Santa Rosa – PE; Puno – PE)
- Hotel: Balsa Inn

Surpresas agradáveis outras nem tanto – Parte III
Por pouco não ficamos sem gasolina
Na próxima localidade distante aproximadamente 40 km estava programado o abastecimento. A neve aos poucos foi diminuindo, se destacava no telhado das casas e no pico das montanhas. Chegando a localidade de Santa Rosa onde abasteceríamos a rua que dava o acesso para entrar na cidade estava interditada, pois a chuva fizera um grande estrago ali. Pedimos informações sobre onde se localizava o grifo da cidade e nos informaram que ficava um pouco mais adiante na beira da estrada. Seguimos e rodamos um bocado e nada do grifo aparecer. De repente após uma curva aparece o grifo, que se resumia somente a uma bomba de gasolina e outra de diesel, GrifoLuz de Los Andes”, uma visão dos infernos em termos de posto de combustível, se é que podemos chamar aquilo de posto. Paramos e surge uma senhora com uma menininha para nos atender, pedimos para encher o tanque e ela diz que estão sem luz e sem energia elétrica a bomba não funcionava. O Álvaro me olha e diz que seu sexto sentido estava o alertando e já desconfiava que isto pudesse acontecer. Nesta hora lembra-se daquele velho ditado nunca deixe baixar da metade do tanque e abasteça assim que tiver uma oportunidade.
- Existe outro grifo aqui na cidade?
- Não.
- A que distância fica o próximo grifo?
- Somente em Juliaca.
Não teríamos combustível até lá e agora?
- Preciso de gasolina onde posso conseguir?
- Tenho em bombona aqui.
- Como?
Ela explica que tem a gasolina em uma bombona e pode abastecer com um funil. Sem saber a qualidade do combustível, porém sem outra alternativa abastecemos. Este foi nosso primeiro contato com este tipo de abastecimento, mas que faríamos uso várias vezes daqui para frente. Presenteio a simpática menininha, filha da proprietária do grifo com algumas balas e lembro que em várias ocasiões em Cuzco elas fizeram um grande sucesso (As balas eram as que ganhamos da simpática senhora da venda pós-pedágio em Arequipa = Que Deus a abençoe). Principalmente nos passeios em Cuzco onde havia muitas crianças insistentemente vendendo artesanato e quando ganhavam algumas balas até esqueciam que precisavam vender seus produtos. É triste toda esta pobreza onde você consegue fazer a alegria de uma criança com algumas balas. E agora vamos ver até onde esta gasolina vai nos levar. Voltamos à estrada e logo percebemos que o rendimento da moto caiu bastante. Rezamos para que conseguíssemos chegar ao nosso destino com ela. Pela primeira cidade que passamos uns 40 km adiante, havia um grifo e parecia ser bem estruturado. O que não tem remédio, remediado está. Mas que deu vontade de voltar e dizer umas boas para a mulher, não posso negar.
Chuva, frio de congelar e o caos de Juliaca.
Depois de uma hora na estrada e faltando aproximadamente sessenta quilômetros para Juliaca o céu escureceu. Paramos para colocar as luvas e fechar qualquer possível entrada de água. Mal terminávamos de colocar as luvas e os primeiros pingos de chuva começavam a cair. A viagem evoluiu de forma bem mais lenta, pois chovia torrencialmente, a temperatura havia caído muito e o asfalto estava todo esburacado. Muita tensão. Na entrada de Juliaca não havia sinalização e resolvemos parar para pedir informações. Infeliz idéia. Um senhor se aproximou e quase caímos, não sei se pelo fato dele se apoiar na moto ou se ficamos tontos com o seu bafo de cachaça. O homem estava completamente bêbado, como diz o Álvaro estava borracho e não sei como ainda ficava de pé. Escolhemos a dedo para quem pedir informação. Ele fez sinal que devíamos seguir em frente, mas queria continuar conversando... Um saro... Livramo-nos dele, e não preciso dizer que ele não ajudou em nada, e seguimos o fluxo sendo necessário passar por dentro desta terrível cidade. Lá tivemos uma idéia do significado da palavra caos: As ruas estavam alagadas, a calçada em muitos pontos não se enxergava, pois era um rio só. Carros, moto táxis, bicicleta táxis e pedestres numa rua onde não há preferencial, onde não sinalizam quando vão dobrar ou seguir em frente, onde há uma brecha eles vão se enfiando e como se isto tudo não bastasse parece que nasceram com a mão grudada na buzina. Tivemos o azar de passar nesta confusão no final da tarde, ou seja, hora do “rush” e com chuva onde tínhamos que viajar com a viseira entreaberta, pois não enxergávamos nada. Andamos algumas quadras e nova parada para informações, teríamos que dobrar a esquerda e seguir em frente. Foram mais algumas quadras em meio ao caos e estresse total, quando finalmente vimos uma placa com a indicação da direção de Puno. Agora estávamos numa pista dupla e com um bom asfalto, torcendo que fosse assim até o nosso destino. Como é possível alguém viver numa cidade tão feia e com um trânsito tão caótico? Agora que a adrenalina havia baixado até conseguíamos rir de todo aquele estresse e já estávamos curiosos se Puno nos receberia com a mesma confusão.
Puno e o encontro com nossos amigos
A chuva amenizou um pouco e a estrada estava em boas condições. Chegamos ao acesso de Puno onde do alto enxergávamos o Lago Titicaca e a cidade lá em baixo, apesar da chuva era uma visão muito bonita. O trânsito era uma tranqüilidade comparado ao de Juliaca, pegamos informações de como chegar à praça de armas. Lá fui ao centro de informações turísticas me informar sobre o hotel onde nossos amigos estavam hospedados, assim ao menos esperávamos. Por sorte ficava numa rua paralela a praça e foi fácil encontrar. Entro na recepção para ver se ainda estavam lá e o atendente confirma que sim e por sorte havia vaga. Começamos a descarregar a bagagem e em menos de um minuto surge o nosso amigo Serra que nos viu chegando pela janela do seu quarto através do reflexo da moto no prédio em frente. Éramos a felicidade em pessoa neste encontro emocionado, pois muitas vezes durante a execução do nosso projeto de viagem imaginávamos que isto pudesse acontecer, mas não sabíamos em que local ou se aconteceria. O Serra subiu correndo as escadas para avisar a Manja que havíamos chegado e nem lembrou que estava sofrendo com a altitude e o ar rarefeito. Em instantes surge a Manja, estávamos todos emocionados, reunidos no saguão de entrada do hotel celebrando tantas benções que tivemos até ali. Combinamos que sairíamos para jantar assim que tivéssemos guardado nossa bagagem e tomado um banho. Enquanto um atendente levava a bagagem para o quarto o outro acompanhava o Álvaro para mostrar onde ficava a garagem do hotel. Como esta ficava a algumas quadras dali, ele (o atendente) pulou na garupa da moto e deixou o piloto apavorado, pois não parava de balançar de um lado para o outro em cima da moto, como disse o Álvaro: - Parecia um lambari. Com o banho quente e reparador nos sentíamos realizados depois deste dia de aventuras e conquistas. Vencemos com sucesso as adversidades. Encontramo-nos para o jantar, saímos a pé na chuva fina que caia e fomos a um belo restaurante. A conversa rolou solta, pois todos tinham aventuras para contar, o pneu furado da moto do Eliseu no Chile, o motor da moto do Serra que esquentou demais com o trânsito de La Paz, nosso disco de freio traseiro rachado e a aventura do dia de hoje entre Cuzco e Puno. Como estávamos indo em direções opostas aproveitamos para trocar muitas informações sobre condições das estradas e postos de abastecimento. A noite foi curta para tanta conversa. Na manhã seguinte faríamos o passeio pelo Titicaca e nossos amigos seguiriam viagem para Cuzco. Caímos na cama nos sentindo felizes e realizados. Um baita sentimento de vitória alcançada neste dia. Merecíamos um tranqüilo e confortável descanso embaixo do edredom quentinho depois de um dia com tantas surpresas.


18/08/2010

20º dia (Parte II) – 25/01/2010 – Segunda-feira

Cuzco – PE a Puno – PE
- 390,7km percorridos
- aproximadamente 11h de viagem
- consumo: 16,14km/l
- 2 abastecimentos: (Santa Rosa – PE; Puno – PE)
- Hotel: Balsa Inn

Surpresas agradáveis outras nem tanto – Parte II
Ruína de Raqchi
Rodamos mais uns 60 km e chegamos ao acesso da Ruína de Raqchi. A estrada era de terra e estava com bastante lama e escorregadia. A chuva havia dado uma trégua nesta última hora e a viagem foi bastante tranqüila. Compramos nosso ingresso a dez soles e contratamos um guia para nos acompanhar. Esta ruína chama a atenção primeiramente por ser numa área plana e por este motivo não há terrazas. O complexo arqueológico é caracterizado por sua estranha e extraordinária técnica arquitetônica, totalmente diferente das demais construções incas. Todos os recintos são construídos com pedras vulcânicas e somente o templo de Wiracocha tem a pedra finamente trabalhada e possui colunas redondas. Todas as portas, janelas e muros são em forma de trapézio para resistirem a abalos sísmicos e as paredes receberam uma fina camada de argila avermelhada. As colcas (armazéns) aqui são construções circulares com um diâmetro de oito metros e quatro metros de altura. Foram construídas com as pedras vulcânicas e unidas com barro, possuem uma entrada muito estreita e duas pequenas janelas, o telhado é em forma cônica e coberto por uma fina palha. Somente algumas das cento e cinqüenta e seis colcas foram totalmente restauradas. Todas elas construídas muito próximas umas das outras. Há uma muralha que cerca o complexo com cinco quilômetros de extensão, três metros de altura e dois metros e meio de largura, possuindo uma entrada e uma saída. A função desta muralha não se sabe ao certo, mas acreditam que servia como controle social e para que as lhamas pastassem na montanha dentro da muralha. Há também uma lagoa artificial em forma de meia lua e sua base foi toda construída com pedras vulcânicas bem lisas. Muito interessante. Ao lado do complexo há várias casas e os moradores cultivam plantações dentro dos limites do complexo arqueológico. Na entrada construíram uma igreja católica também em pedra vulcânica no final do século XVIII e no pátio em frente à igreja os moradores montam suas tendas e vendem seu artesanato. Aproveitamos para comprar umas lembrancinhas incluindo um livreto (mais um para a coleção do Sr. Álvaro) sobre a história da Ruína de Raqchi e seguimos viagem.

O branco da neve
O asfalto se encontrava a partir dali, em estado regular, às vezes com algumas pedras caídas sobre a pista o que fazia o Álvaro pilotar com bastante atenção. Continuamos vendo um rio bastante caudaloso correndo ao lado da estrada. Vários prejuízos causados pela inundação em pequenos vilarejos e até cidades um pouco mais populosas. Casas inundadas ou destruídas, pontes que foram levadas com a violência das águas deixando os moradores isolados e plantações inundadas eram imagens constantes. Muitas pessoas especialmente Cholas com seus trajes característicos e crianças sentadas na beira da rodovia. Com quase uma hora de viagem começavam a surgir alguns picos nevados lá ao longe. A cada curva as montanhas ficavam mais brancas. Em instantes tudo tinha ficado branco, coberto pela neve. Os trilhos do trem que corriam ao lado da estrada se destacavam pelo acúmulo de neve em relação à vegetação ao seu redor. Uma imagem belíssima e nós estávamos maravilhados, pois mesmo quando fomos a Ushuaia não encontramos tanta neve. Paramos para curtir a paisagem e tirar algumas fotografias. O gelo que estava sobre a pista recém havia derretido, pois ainda conseguíamos ver a sua evaporação. Comentei com o Álvaro que devíamos estar muito próximos do ponto mais alto deste trecho chamado Abra La Raya com 4.335 m.s.n.m. divisa entre a região de Cuzco e Puno. Voltamos à estrada e em cinco minutos chegávamos a esta divisa onde moradores aproveitavam para vender seu artesanato. A neve acumulada era tanta que fizeram vários bonecos e lhamas de neve e um deles até com direito a cachecol. Mais algumas fotos e seguimos viagem, pois já eram 14h e 30 minutos e não sabíamos o que mais nos aguardava na estrada até o nosso destino e ainda nem estávamos na metade do caminho.
OBS: o relato deste dia continuará no post seguinte.