18/06/2010

14º dia – 19/01/2010 – Terça-feira

- Nazca – PE a Cuzco – PE
- 667,3 km percorridos
- Aproximadamente 14h de viagem
- Consumo: 16,5 km/l
- 4 abastecimentos: (Puquio – PE; Chalhuanca – PE; Abancay – PE; Cuzco – PE)
- Hotel: Apu’s Dream

NAZCA A PUQUIO
A lua ainda brilhava no céu estrelado às 5h da manhã quando saímos do hotel. Passamos no grifo para abastecer e na feira livre na saída de Nazca compramos água e algumas frutas. Alguns quilômetros rodados e os primeiros raios de sol iluminavam timidamente as montanhas que gradualmente subíamos. A temperatura estava agradável e havia poucos nuvens no céu. A estrada com asfalto em estado razoável vai serpenteando a montanha e vamos ganhando altitude rapidamente, não há proteção alguma na beira da estrada e o precipício aumenta a cada curva. A paisagem é de tirar o fôlego, incrível a beleza das montanhas na região. Rodávamos pouco mais de meia hora e encontramos a via em obras, esperamos uns dez minutos e nos liberaram, pegamos uns dois quilômetros sem asfalto, porém era de terra compactada onde espalhavam cal preparando a base para o asfalto. Rodamos mais um pouco e nova parada de dez minutos, porém agora a estrada era de rípio com pedras soltas e sem os trilhos bem definidos. Começamos a rodar com todo cuidado num momento de muita tensão e medo, pois atrás de nós seguiam vários caminhões pressionando para acelerarmos e quando vinham carros ou caminhões em sentido contrário tínhamos que abrir espaço e nos aproximávamos mais do lado do precipício o que causava um arrepio. Fui rezando e pedindo para a mão de Deus nos guiar neste trecho do caminho, pois cair ali era uma idéia que não nos agradava em nada. Num determinado momento levamos um grande susto, a moto dançou um pouco, porém o piloto com sua habilidade e guiado pela mão divina conseguiu equilibrá-la e seguimos sacolejando nas pedras por uns dez quilômetros. Nova parada devido as obras na via e o rípio continuava mais a frente. Aproveitamos para esticar as pernas e fazer um alongamento para aliviar a tensão sofrida neste trecho. Conversávamos com uma senhora moradora da região que vendia choclo com queso, resolvemos provar esta iguaria típica que era uma espiga de milho cozido acompanhado de uma fatia de queijo colonial, porém o milho peruano tem dentes muito maiores que o milho brasileiro e é muito saboroso. Com ela descobrimos que estávamos próximos do ponto mais alto da região que está a 4.330 m.s.n.m. e parece loucura mas a cinqüenta quilômetros atrás estávamos a 588 m.s.n.m. em Nazca. Depois de meia hora aguardando finalmente liberaram a pista, deixamos os caminhões seguirem e vamos atrás deles, pois não sabíamos quanto rípio encontraríamos pela frente. Por sorte mais um quilômetro e retornávamos ao asfalto, agora novinho em folha, uma recompensa pelo estresse provocado no trecho de rípio. Com todas estas paradas e a baixa velocidade empreendida devido à quantidade de curvas havíamos rodado 50 km em 2h e 30 minutos, diagnóstico nada satisfatório para quem tinha a intenção de chegar a Cuzco ainda neste dia. Agora com a estrada em ótimas condições continuávamos subindo e curtíamos com mais tranqüilidade as belezas naturais a nossa volta. Em poucos minutos já estávamos na Reserva Nacional Pampas Galera que tem 6.500 hectares na localidade de Lucanas. O controle da fauna na reserva começou no ano 1965 e ao longo de mais de trinta anos de trabalho constante foi alcançada a recuperação da população de vicunhas e este restabelecimento foi possível por meio do controle da caça furtiva e a proibição do comércio internacional da fibra de vicunha. Percebe-se que realmente obtiveram êxito, pois há dezenas delas pastando ao lado da via com toda tranqüilidade do mundo. A temperatura nesta altitude caiu bastante, mas com a presença do sol era amenizada um pouco, chegamos a ver vestígios de gelo acumulado na beira da estrada e provavelmente a algumas horas atrás encobria toda a região. Muito interessante a mudança da paisagem, pois em Nazca e nas montanhas que subimos só víamos a aridez do deserto e depois de muitos quilômetros surgiu uma vegetação baixa de cor dourada por um bom trecho. Atingimos o ponto mais alto com um frio intenso, estávamos no alto da montanha iniciando a descida e depois de uma curva o que enxergávamos era uma cadeia montanhosa a nossa frente toda verde e com um pequeno vilarejo com seu telhado de zinco reluzente instalado lá no meio dela. Incrível a mudança. Continuamos serpenteando a montanha, porém agora descendo, e foram vários quilômetros até chegarmos ao vilarejo que enxergávamos pequenino lá do alto da montanha. Tivemos mais três paradas na estrada, uma antes do vilarejo, pois pintavam a sinalização da pista, a segunda dentro do vilarejo para a travessia do gado que era conduzido sobre o asfalto e a última na saída onde máquinas trabalhavam retirando a terra que havia desmoronado sobre a via. Um vilarejo que vive basicamente da agricultura e criação de gado, provavelmente mantendo seus costumes inalterados desde os tempos incas. Depois de meia hora rodando chegamos à Puquio que está a 3.221 m.s.n.m., onde abastecemos na entrada da cidade. Estavam pavimentando a estrada que passa por dentro da cidade, uma confusão de desvios e um bom trecho com estrada sem pavimento e muito pó. Optamos em não visitar a cidade e prosseguir a viagem devido ao horário, pois eram 10h da manhã e havíamos percorrido 155 km em 5h e faltavam 500 km até Cuzco.

PUQUIO A CHALHUANCA
A cidade de Puquio foi ficando cada vez menor à medida que subíamos a montanha. A paisagem muda para uma vegetação baixa novamente, porém mais verde que dourada. Paramos onde havia uma grande quantidade de lhamas pastando e o proprietário corria atrás de uma desgarrada e deixando sua filha, uma criança, cuidando do rebanho. Conversando com ele pedimos informações sobre a chuva confirmando o que nos disseram no grifo de que ela iniciava todo dia depois das 4h da tarde neste período do ano. Alguns quilômetros mais e estávamos no altiplano com suas lagoas refletindo o azul do céu e o branco das nuvens que apareceram em grande quantidade. A temperatura baixou bastante devido a altitude e ao aumento das nuvens que escondia o sol. O cansaço neste dia estava grande, fazíamos uso das folhas de coca desde a saída de Nazca, mas devido à quantidade de horas sempre acima dos três mil metros o corpo sentia os efeitos do ar rarefeito. A moto parecia não se importar muito, pois seguia muito bem mesmo com o problema no disco de freio traseiro, o piloto controlava com cuidado para não ter que fazer nenhuma freada brusca e utilizava mais o freio dianteiro quando possível. Talvez esta atenção extra também tenha contribuído para o cansaço dele. Passeamos por mais de uma hora pelo altiplano com a paisagem de lagoas e lhamas pastando. Aqui tem que se ter o cuidado redobrado com elas, pois descobrem repentinamente que a grama do outro lado da pista está melhor e atravessam a pista bem na hora que você está passando. É uma região desabitada onde encontramos dois ou três pequenos vilarejos com meia dúzia de casas na beira da estrada e num deles vi um pequeno restaurante e nada mais que isto de infra-estrutura. Subimos até os 4.400 m.s.n.m. e depois serpenteávamos a montanha iniciando a descida para chegarmos à base dela junto ao rio Chalhuanca correndo a nossa direita. Pela primeira vez neste dia encontrávamos uma placa com o nome das cidades e sua respectiva distância, ufa estávamos no caminho certo. Estranha a sensação de rodar no vale que está a 2.911 m.s.n.m., pois em uma hora de viagem descemos mais de mil e quatrocentos metros de altura e a temperatura aumentava significativamente. Neste trecho rodávamos entre paredões de rocha de onde desciam pequenas cascatas de água rente a estrada, sorte que ainda não tinha chovido, pois fiquei imaginando como ficaria aquele volume de água depois de uma chuva. Moradores criavam suas vacas soltas pastando ao lado da estrada e algumas encontramos desfilando sobre a pista. As montanhas ficaram mais verdes e encontramos nosso primeiro rio atravessando a pista. Desço para conferir o melhor lugar para fazer a travessia. O volume de água não era tão grande, mas havia pedras e terra que a água trouxera quando estava com um volume maior. Retiro as pedras maiores e fico dentro da água para orientar o Álvaro na passagem, sucesso total. Mais cinco minutos e chegávamos à Chalhuanca para abastecer na entrada da cidade. De Puquio a Chalhuanca fizemos 185 km em 3h e 30 minutos.

CHALHUANCA A ABANCAY
Em Chalhuanca há dois hotéis e dois restaurantes na beira da estrada, não sabemos a qualidade deles, pois somente vimos na passagem. Há um pouco de infra-estrutura, mas não passa disso, pois é um vilarejo pequeno. Continuávamos a rodar pelo vale e com o rio bastante caudaloso nos acompanhando por vários quilômetros bem ao lado da estrada. Passamos por mais dois cursos d’água atravessando a pista, porém bem menores que o primeiro. Começávamos a subir novamente até os 3.400 m.s.n.m. e as nuvens que haviam aumentado ficavam cada vez mais escuras. Fomos rezando para que não nos encontrássemos, pois viajar com chuva não estava nos nossos planos. Encontramos vários trechos com pedras caídas sobre a estrada, em alguns momentos chegavam a interditar uma das pistas. Na grande maioria destes pontos havia sinalização ou pessoas trabalhando na remoção do entulho. Encontramos pequenos vilarejos ao longo da estrada onde vivem ou sobrevivem não sei como, pois é tão distante de tudo, mas devem ser felizes com a vida simples que levam. Viajávamos em meio a montanhas verdejantes e começamos a descida rumo a Abancay que está a 2.378 m.s.n.m. uma cidade bem maior e com mais infra-estrutura. Não gostamos da cidade, talvez por termos tido uma experiência nada agradável no grifo na entrada da cidade onde o frentista foi muito mal educado conosco. Pelo nosso cronograma tínhamos projetado dormir nesta cidade se não houvesse tempo suficiente para chegarmos a Cuzco no mesmo dia, mas como eram 16h resolvemos seguir viagem mesmo faltando 200 km. De Chalhuanca a Abancay fizemos 111 km em 2h e 30 minutos.

ABANCAY A CUZCO
Para seguirmos na direção de Cuzco tivemos que passar por dentro de Abancay e subir uma ladeira sem fim e com pouca sinalização. Saindo da cidade começam os cotovelos um atrás do outro, vamos subindo até os 4.000 m.s.n.m. num percurso de trinta quilômetros mais ou menos. As nuvens estavam negras e encobriam totalmente o nevado que estava a nossa esquerda, parecia que ficavam mais escuras a cada curva que fazíamos e Abancay praticamente sumia lá no fundo do vale. Quando chegamos ao cume fomos brindados com um belo arco-íris, pois já havia chovido do outro lado da montanha. Paramos e fotografamos a bela imagem que para nós foi um presente de Deus e em seguida pára um motociclista polonês morador de Lima que também está indo para Cuzco para apreciar o belo momento. Liguei para a Rocio nosso contato em Cuzco avisando da nossa chegada ainda naquela noite na cidade e combinamos de nos encontrar em frente à Catedral. Agora mais tranqüilos por termos a assistência necessária quando da nossa chegada seguimos viagem. Começamos a descida em cotovelos e alcançamos a chuva fina que caia. Optamos em seguir sem colocar as roupas de chuva, torcendo para que ela parasse mais adiante. Depois de dez minutos rodávamos no seco novamente, passamos por vários pequenos vilarejos e o asfalto estava em péssimas condições em alguns pontos. Descemos até os 2.700 m.s.n.m. na localidade de Curahuasi trajeto com muitas curvas e onde atravessamos o rio Apurimac. Dali viajamos com o rio Limatambo ora a nossa direita ora a nossa esquerda e depois subimos até os 3.900 m.s.n.m. novamente serpenteando a montanha e após descemos até os 3.400 m.s.n.m. em direção a Cuzco. Na meia hora final da viagem houve bastante estresse, pois viajávamos no escuro e chuviscava. Como estávamos perto da cidade havia muito movimento de carros e as suas luzes atrapalhavam muita a visualização das placas de sinalização. Reduzimos bastante o ritmo neste percurso, entramos na cidade e não havia sinalização de como chegar à praça de armas, nem a bela visão da cidade com suas luzes acessas vista ali do alto tranqüilizava nossos corações. Informações desencontradas sobre o rumo que tomaríamos para chegar ao centro, cada bifurcação mais uma dúvida. As ruas eram de uma pedra redonda e muita lisa devido à chuva e que nos deixava preocupados. Sugiro ao piloto pegarmos um táxi para nos guiar até o nosso destino e assim fizemos. Levo a mala tanque comigo no táxi para aliviar o peso e ficar mais fácil de conduzir a moto e peço ao motorista seguir devagar, pois a moto teria que nos acompanhar. Quando ele inicia a descida de uma ladeira muito íngreme e com aquelas pedras lisas me preocupo com o Álvaro. Aquela descida era mais um teste para ver como estava funcionando o freio da moto devido ao problema no disco, mas graças a Deus correu tudo bem e em menos de cinco minutos estávamos em frente à Catedral e o nosso contato já nos aguardava. Pegamos outro táxi e seguimos até o hotel Apu’s Dream onde ficamos instalados. Tomamos um chá de coca para nos aquecermos e logo nos sentíamos renovados. Contratamos todos os passeios que queríamos fazer na região com a nossa agente de turismo a senhora Rocio. Tomamos um merecido banho e fomos jantar num restaurante próximo ao hotel, pois estávamos famintos. De Abancay a Cuzco fizemos 200 km em 3h de viagem. Foi um dia bastante cansativo devido à altitude da região e às 14h de viagem, mas a beleza do Criador compensou todo este esforço. Estávamos realizados e felizes, especialmente o Álvaro que afirmou pela manhã que faríamos a viagem até Cuzco em um dia. Graças a Deus conseguimos, foi uma vitória e será inesquecível. Quem tiver oportunidade de passar pela região e gostar de natureza com certeza não se arrependerá. Tivemos uma viagem abençoada e os nossos temores de como seria a viagem se mostraram infundadas, mas uma viagem sempre é diferente da outra.

Confira também o post feito pelo Álvaro no dia 20/01, logo após chegarmos em Cuzco.

OBS: infelizmente a bateria da máquina fotográfica não aguentou toda a viagem, então as três últimas fotos são da região de Abancay e dali até Cuzco ficamos com as imagens somente na memória.